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“Pegarão nas serpentes, e, se beberem alguma coisa mortífera, não lhes fará dano algum…"

A prática do encantamento de serpentes é antiga e se encontra agora difundida por uma considerável área geográfica. Ela envolve a manipulação destes animais, normalmente exemplares venenosos, através do som de palmas, de instrumentos musicais ou com as mãos nuas. O Egito faraônico e helenístico era o lar de uma forma de encantamento de serpentes registrada em certos documentos textuais e iconográficos, mas a prática mais popular, conforme hoje existente, provavelmente surgiu no Hindustão e foi, de fato, durante vários séculos o monopólio de certas tribos indianas. Na contemporaneidade, apresentações de encantadores de serpentes podem ser testemunhadas na Índia, no Paquistão, no Nepal, em Bangladesh, no Sri Lanka, na Tailândia, na Malásia, na Indonésia, nos Emirados Árabes, no Egito, no Marrocos e na Tunísia. Isso, contudo, parece estar gradativamente desparecendo, em função das sensibilidades atuais a respeito do bem-estar animal e da aplicação da lei federal indiana de 1972 que proibiu a posse de serpentes por particulares, virtualmente inviabilizando este antigo ofício no país.


Os primeiros encantadores de serpentes muito provavelmente eram também curandeiros ou feiticeiros, ou pelo menos estreitamente associados a eles – como, por exemplo, aparece no Livro dos Salmos (58:5-6), em uma das mais antigas menções documentais conhecidas a seu respeito. Há bom indício de que tal prática tenha tido origem religiosa, o que poderia razoavelmente ser vinculado a certos cultos ofilátricos egípcios e indianos. Encantadores de serpentes aprendiam a lidar com diversos tipos de venenos e a neutralizar seus efeitos como parte de seu treinamento, e também, por motivo óbvio, considerava-se que eram homens particularmente próximos de entidades ofídicas como os nāgas e nāginis, membros de raça semi-divina que os hindus acreditam viver no Pātāla, os belos reinos subterrâneos, e associam a diversos de seus heróis e deuses. Encantadores de serpentes eram mantidos de forma permanente por comunidades próximas de áreas densamente arborizadas ou pantanosas para poder retirar sem maiores incidentes animais venenosos que eventualmente entrassem em suas casas e edifícios públicos. Em Charkhi Dadri, no Estado de Haryana, no norte da Índia, há um templo dedicado a Baba Gulabgir, santo padroeiro dos encantadores de serpentes, de quem se diz que viveu como andarilho ensinando as pessoas a reverenciar os répteis, não temê-los, pregando que deveriam ser bem tratados, alimentados e reconduzidos à natureza. Graças à pregação deste guru, inumeráveis serpentes inofensivas foram poupadas de ser mortas por pessoas ignorantes simplesmente por estarem na hora e lugar errados em busca de alimento ou bebida, enquanto tantas outras deixaram de ser abusadas por encantadores inescrupulosos que quebravam suas presas, cortavam suas glândulas venenosas ou costuravam a maior parte de suas bocas para poder manipulá-las em segurança sem grande trabalho. Parece remeter aos seus ensinamentos a prática comum aos encantadores de serpentes de boa parte do Hindustão e do Sudeste Asiático contemporâneo de devolver os animais às matas depois de utilizá-los em uma sequência de quarenta apresentações públicas.

Grupo de encantadores de serpentes. Varanasi, Estado de Uttar Pradesh, Índia, 1910.

Em diversas regiões da África Central e Ocidental, do Caribe e da Mesoamérica também se desenvolveram tradições de encantadores de serpentes. Sem possuir qualquer vínculo aparente com as vertentes egípcia ou indiana, a prática se encontra registrada em histórias tradicionais e documentos textuais e iconográficos – como, por exemplo, em uma interessante estela maia encontrada no sítio arqueológico de Aparício, habitado entre 700 e 900 d.C., localizado próximo à cidade mexicana de Veracruz. Ela também é um elemento relevante da cultura dos hopi, atualmente restrita em sua forma mais tradicional a um pequeno grupo de pessoas confinadas a uma reserva indígena em território estadunidense. De fato, o encantamento e manipulação de serpentes integra um de seus mais importantes rituais anuais, realizado entre o meado e o fim de agosto. Os hopi acreditam que as cobras transmitem suas mensagens ao submundo, onde se escondem os deuses da chuva, responsáveis por fertilizar a terra. Alguns traços marcantes da cultura hopi podem ser encontrados entre outras populações ameríndias, de áreas tão distantes entre si quanto o Yucatán ou a borda do Círculo Polar Ártico, o que leva alguns estudiosos a supor que os membros deste grupo indígena encontrados durante o período colonial e pós-colonial pelos euro-americanos são, de fato, remanescentes de uma população anterior muito mais vasta (ou móvel).

Nativos da tribo hopi em ritual tradicional, foto do início da década de 20.

A prática do encantamento de serpentes também se desenvolveu, já na contemporaneidade, em pelo menos um contexto bastante inesperado. A Igreja de Deus que Opera Sinais é uma comunidade pentecostal norte-americana cujos líderes e alguns fiéis praticam o manuseio de serpentes venenosas e a ingestão de diferentes tipos de venenos (de origem animal ou não) durante seus cultos como forma de demonstrar a força de sua fé. Tais práticas tiveram origem discernível em comunidades cristãs revivalistas no oeste dos Montes Apalaches, nos Estados do Kentucky, do Alabama e do Tennesse nos anos iniciais do século XX. Formalmente, baseiam estes ritos característicos em uma leitura literal de certo trecho do Evangelho de Marcos (16:17-18), associando-os a algumas outras notas típicas do pentecostalismo, fundamentados em larga medida neste mesmo texto bíblico, como os exorcismos frequentes, a glossolalia e as curas pela imposição de mãos. Antropólogos e historiadores das religiões, contudo, chamam a atenção para o quanto as práticas dos membros da Igreja de Deus que Opera Sinais são similares, por um lado, às de antigos habitantes indígenas da mesma região do oeste dos Montes Apalaches e de outras partes ocidentais do que veio a ser o território dos EUA, assim como de certas sociedades de devotos dos loa Damballah e Ayida-Weddo, espíritos serpentinos que são centrais no sistema do Vodu Haitiano e do Mississipi; e, de outro, dos Ofitas, membros de uma antiga e pouco conhecida facção cristã, de caráter gnóstico, que parece ter identificado a Serpente mencionada no Livro do Gênesis a Cristo e foi ferozmente denunciada como herética por personagens como Hipólito de Roma (170-235) e Epifânio de Salamina (c.310-403).


A prática da manipulação de serpentes em cultos pentecostais surgiu pela primeira vez por volta de 1915 e foi associada ao ministério de George Went Hensley (1881-1955). Tratou-se este de personagem controverso, vindo de rigorosa criação batista, pouco instruído, parece que nunca inteiramente alfabetizado, que trabalhou como mineiro e participou de reuniões revivalistas realizadas em campos de mineração de carvão na década de 1890. Em um destes encontros religiosos, teria testemunhado uma idosa de origem indígena manusear uma serpente enquanto pregava justamente a respeito de Mc 16:17-18, uma experiência que o deixou profundamente impressionado, fazendo que mais tarde se decidisse pela vida como missionário na Igreja da Santidade de Deus, sediada em Cleveland, Tennessee, denominação pentecostal dissidente do metodismo. Depois de passar por uma série crise pessoal, durante a qual tinha pesadelos, convulsões, visões, desmaios, episódios graves de sonambulismo e começou a questionar a sua salvação, Hensley retirou-se para orar em uma montanha e pedir a orientação do Espírito Santo. Durante essa experiência, encontrou uma cobra de chifres, que tomou em suas mãos e levou à sua congregação no próximo culto dominical, como uma prova de que era um homem justo e abençoado por Deus. Os dirigentes da Igreja da Santidade de Deus inicialmente não se opuseram às peculiaridades do ministério de Hensley, e ele, assistido por seus familiares, tornou-se pregador e dirigente de comunidades em Grasshopper Valley, Birchwood e mesmo em Cleveland, parece que só não se tornando bispo por causa de sua pouca educação formal, sua nenhuma disposição em adquiri-la e seus inúmeros problemas pessoais. Ele finalmente se tornou um dissidente desta denominação em 1922 e em seguida foi preso diversas vezes por acusações relacionadas à bebedeira e venda de bebidas durante a época da proibição (1920-1930), malversação de dinheiro eclesiástico, espancamento de suas esposas e filhos (casou-se quatro vezes e teve treze filhos), violação da ordem pública, extorsão, fraude, roubo, caça ilegal e transporte ilegal de animais selvagens.

Pr. George Went Hensley em culto da Igreja de Deus que Opera Sinais, década de 1950.

Tendo-se tornado um constante fugitivo da polícia do Tennessee, do Kentucky e da Virgínia, Hensley viajou para Ohio onde realizou campanhas evangelísticas e serviços de avivamento como um pregador itinerante, reunindo assembleias que variavam de pequenos grupos em casas e tendas nas periferias das cidades a grandes reuniões nas praças centrais diante das prefeituras, reunindo centenas de pessoas e chamando a atenção das autoridades e da mídia. Nestes encontros, ele plantou as primeiras comunidades da Igreja de Deus que Opera Sinais, aliando à prática de manipulação de serpentes e venenos uma pregação cada vez mais rigorista e paranoica. Hensley alegou ter sido picado por cobras venenosas mais de quatrocentas vezes sem quaisquer efeitos prejudiciais durante seu ministério, assim como ter tomado grande quantidades de veneno líquido, incluindo estricnina e ácido de bateria, em êxtase religioso, “movido pelo Espírito Santo”. Em 1955, enquanto conduzia um culto na Flórida, contudo, ele foi picado no pulso direito e ficou imediata e violentamente doente; tendo se recusado a receber atendimento médico, como sempre fazia e recomendava que seus fiéis fizessem, acabou morrendo poucas horas depois. Os membros de sua Igreja tem dele a memória de um grande homem, tendendo a descartar suas falhas pessoais como invenções difamatórias e seus numerosos problemas legais como resultado de perseguições e conspirações promovidas pelos “incrédulos”, “falsos crentes”, “romanistas”, judeus, negros, comunistas e liberais. Sua autoconfiança, seu senso de missão, sua capacidade de liderança e seu carisma pessoal, sem dúvida, foram fatores da maior importância para estabelecer e fazer crescer a Igreja de Deus que Opera Sinais.


Alguns autores chamam a atenção para que, embora as práticas de manipulação de serpentes e venenos tenham aparecido publicamente de forma espetacular no ministério de Hensley e se institucionalizado na Igreja de Deus que Opera Sinais, elas parecem ter se estabelecido no âmbito evangélico pelo menos alguns anos antes, surgindo em várias partes dos EUA de forma mais ou menos simultânea entre o fim do XIX e o meado da década de 1930. A Igreja do Senhor Jesus que Realiza Sinais, fundada por James Miller em Sand Mountain, Alabama, em 1923, como uma dissidência unitarista da mesma Igreja da Santidade de Deus de Cleveland, desenvolveu a prática da manipulação de serpentes e venenos nos cultos de forma independente de qualquer contato com o ministério de Hensley. Aconteceu, entretanto, de uma considerável parte dela, estendida em uma área desde o norte da Virgínia Ocidental até a fronteira com o Canadá, entrar em comunhão com a Igreja de Deus que Opera Sinais ainda no fim da década de 1930. Não há dúvida, no entanto, que Hensley e seus seguidores ajudaram a espalhar tais práticas por todo o entorno dos Apalaches e sul dos EUA, e que a cobertura que a mídia deu à sua atuação, assim como aos problemas legais dela oriundos, foi um elemento de incentivo para que várias igrejas incluíssem a prática em seus serviços. Efetivamente, parece que ela se espalhou entre uma série de igrejas afro-americanas do Mississipi, da Louisiana, da Flórida e mesmo do Caribe neste momento, mesmo sem ter tido nenhum contato direto com Hensley ou algum dos membros da Igreja de Deus que Opera Sinais – que, aliás, eventualmente comungaram que opiniões bastante racistas, como não era de todo incomum entre evangélicos norte-americanos brancos desse período.


Os cultos da Igreja de Deus que Opera Sinais não são muito diferentes dos demais cultos pentecostais, incluindo cantos, orações, exorcismos, curas pela imposição de mãos, leituras bíblicas, pregações e glossolalia, com a exceção da manipulação frequente de serpentes e venenos. Normalmente as serpentes norte-americanas mais comuns são guardadas imediatamente diante ou imediatamente atrás do púlpito, mas algumas congregações têm se aventurado mesmo a importar (via de regra de modo ilegal) e manipular espécimes asiáticas, africanas e sul-americanas de veneno muito mais letal. Durante os cultos, os fiéis podem se aproximam das serpentes e pegá-las, geralmente erguendo-as, eventualmente permitindo que elas rastejem em seus corpos; isso é considerado uma prova excepcional de fé, um ritual executado normalmente por pastores e outros líderes comunitários, que assim reafirmam publicamente suas capacidades carismáticas e proximidade de Deus, performatizando o domínio sobre os animais em meio a um estado de êxtase religioso, embalado por palmas, cânticos e toques de instrumentos percussivos. Alguns crentes também se dispõem a beber veneno nestes momentos, e há todo um cuidado para demonstrar para a assembleia reunida de que o que está ali se fazendo representa um perigo efetivo para a integridade física do devoto. Há relatos históricos de cultos destes nos quais também se verificaram a manipulação e ingestão de fogo, brasas, ferros quentes, cacos de vidro e de louça, pregos, pedras pontiagudas, espinhos e lâminas de diversos tipos e tamanhos.


As serpentes são consideradas especiais representações ou encarnações de demônios, e manejar as cobras demonstra poder sobre estas entidades inferiores. Se um manipulador é mordido, isso geralmente é interpretado como uma falta de fé, um castigo a um pecado não confessado à comunidade ou uma falha em seguir a orientação do Espírito Santo em algum assunto em particular. Aqueles assim feridos, contudo, nunca são criticados em público por seus correligionários; diz-se apenas que era a vontade e plano divinos afligi-los de tal maneira. Os crentes mordidos não só geralmente não procuram ajuda médica, mas são extremamente estimulados pelos pastores e líderes comunitários a buscarem a cura somente a partir de Deus, através de orações. A primeira notícia de um fiel morto em função de uma picada de serpente em um culto pentecostal ocorreu em 1922, durante uma cruzada evangelística da Igreja do Evangelho de Deus, uma pequena dissidência pentecostal do metodismo instalada em um periferia de Cleveland. Não há confirmação de que este culto tenha sido presido por Hensley em pessoa, mas se sabe que ele foi um fator fundamental para o seu afastamento do ministério na Igreja da Santidade de Deus, o que precipitou a fundação da Igreja de Deus que Opera Sinais.


Desde 1936, conforme Hensley foi se tornando mais conhecido como pregador e acumulando problemas com a justiça, tanto em função de suas atividades como religioso como por outras coisas não diretamente relacionadas a isso, a manipulação de serpentes tornou-se ilegal em vários Estados dos EUA, a começar pelo Tennessee, onde é estritamente ilegal exibir qualquer réptil venenosos de maneira que ponha alguém em risco de ser por ele picado. Os processos referentes a isso, no entanto, sempre foram raros. As eventuais mortes por picaduras ou envenenamento em cultos pentecostais deste tipo, como a do próprio Hensley, normalmente são enquadradas como suicídios. Em 1941, após a morte de uma criança de sete anos picada por uma cascavel em um culto da Igreja de Deus que Opera Sinais, o Estado da Geórgia aprovou uma lei tornando o manuseio de serpentes venenosas em presença de menores de idade um crime passível de pena capital, mas essa punição nunca foi determinada por um júri, e a lei acabou revogada em 1968. A União Americana das Liberdades Civis (ACLU) defendeu diversas vezes de forma pública a liberdade dos manipuladores de serpentes e venenos contra várias tentativas estaduais e federais de proibir a prática, considerando que uma restrição neste sentido seria uma violação de sua liberdade de crença e prática religiosa, direitos inalienáveis de acordo com a Constituição dos EUA.

Fiel da Igreja de Deus que Opera Sinais em êxtase religioso em Evartes, Kentucky, em 22 de agosto de 1944.

Os fiéis da Igreja de Deus que Opera Sinais evitam envolvimento em política partidária e mantêm padrões rigorosos de santidade e moralidade pessoal e coletiva. Eles tendem a se organizar em comunidades autocentradas, mais ou menos marcadas pela endogamia, ainda que eventualmente desenvolvam trabalhos de evangelismo em áreas carentes, tanto rurais quanto nas periferias de grandes cidades. Tendem a evitar o contato com a medicina e a ciência moderna, abominando de forma particular os métodos contraceptivos, o que proporciona que tenham famílias bastante numerosas. Adotam códigos de vestuário rigorosos, como cabelos sem corte, ausência de depilação, uso de saias e vestidos até os tornozelos com meia-calça e nenhum tipo de decote, joia ou cosmético para as mulheres, e calças e camisas de manga comprida para homens. A maioria dos pastores prega contra o uso de qualquer tipo de tabaco, chá, café, bebida alcoólica ou droga recreativa. Cicatrizes causadas por mordidas de serpentes são orgulhosamente exibidas como marcas de provações pelos quais o fiel passou de forma bem-sucedida. Entre os homens, é comum encontrar tatuagens caseiras de temas cristãos tradicionais (cruzes, cordeiros, cachos de uvas, cálices, videiras, peixes, pães, Bíblias estilizadas, mãos postas, versículos bíblicos) e numerosos motivos serpentinos.


A maioria dos evangélicos que manipulam serpentes e venenos em seus cultos ainda é encontrada na parte oeste das Montanhas Apalaches, especialmente no Alabama, no Mississipi, na Geórgia, no Kentucky, na Carolina do Norte, no Tennessee, na Virgínia Ocidental e na Carolina do Sul. Um levantamento feito em 2013 indicou que havia cerca de cento e vinte igrejas nesta região que mantinham esta prática, além de quatro congregações no extremo leste canadense, próximos da fronteira com os EUA, uma na Reserva Navajo e mais meia dúzia nas ilhas do Caribe, sendo as maiores em Porto Rico e na Jamaica. Além da Igreja de Deus que Opera Sinais, outros grupos – normalmente dissidentes dessa denominação – que manipulam serpentes e venenos em seus cultos são: a Igreja da Casa da Santidade (erguida) sobre a Rocha, de Section, Alabama; a Igreja de Nosso Senhor Jesus Cristo, de Kingston, Geórgia; a Igreja do Caminho da Santidade de Deus, de Fort Wayne, Indiana; a Igreja da Santidade Plena, de London, Ohio; a Igreja Pentecostal Mossie Simpson, de Jensen, Utah; a Igreja do Senhor Jesus, em Jolo, na Virgínia Ocidental; o Tabernáculo do Evangelho Pleno do Nome de Jesus, de Middlesboro, Kentucky; a Igreja dos Mistérios e Milagres, de Marshall, Carolina do Norte; a Igreja da Santidade de Deus no Nome de Deus, de Greenville, na Carolina do Sul; a Igreja do Tabernáculo de Deus, de LaFollette, no Tennessee; e a Casa do Senhor Jesus, em Mataoaka, na Virgínia Ocidental. Pesquisadores têm indicado que tais práticas estão em relativo declínio de popularidade em seus meios tradicionais, ou seja, que está ocorrendo um gradativo encolhimento das congregações de formato reconhecível, vinculadas a uma denominação de base nacional, estadual ou municipal; por outra parte, contudo, também que elas têm se expandido em cultos de base familiar ou de vizinhança, que ainda não se conseguiu mensurar de forma adequada. Bem pode ser que hoje existam cristãos encantadores de serpentes como nunca antes existiu na História, e que este seja o maior grupo subsistente a realizar esta prática.

Imagem: O Pr. Mack Wolford manipula serpente como prova de sua fé durante serviço público da Igreja do Senhor Jesus, dissidência da Igreja de Deus que Opera Sinais, estabelecida em Jolo, Virgínia Ocidental, em 5 de setembro de 2011. Ele morreu, considerado pelos seus correligionários como mártir, em função de uma picada de cascavel recebida em um culto da igreja que presidia, em 28 de maio de 2012.


À guisa de comparação e conclusão, deve-se observar que a manipulação de serpentes também não é de todo desconhecida no mundo católico, como evidencia a permanência da festa de São Domingos Abade em Cocullo, na Província de Áquila, no sul da Itália, ainda em nossos dias. São Domingos Abade (951-1031), também conhecido como São Domingos de Foligno ou São Domingos de Sora – e que não deve ser confundido com São Domingos de Guzmán (1170-1221), o criador da Ordem dos Pregadores (i.e. os Dominicanos) -, foi um fundador e reformador monástico beneditino, lembrado como exemplo das virtudes da humildade, da obediência e da piedade, assim como por uma série de milagres. Ele é invocado principalmente contra ataques demoníacos, convulsões, desmaios, sonambulismo, desmoronamentos, enchentes e picadas de cobras. Na primeira quinta-feira de maio (desde 2012, no primeiro domingo), os cidadãos de Cocullo trazem serpentes para cobrir a imagem do santo, que é assim levada em procissão pelas ruas da cidade. O tipo de réptil preferido para tal função é a serpente conhecida como succiavacche, tipo de cobra não-venenosa relativamente comum na região. Ao fim do cortejo, proclama-se o trecho do Livro dos Números que conta a história do erguimento de uma serpente de bronze no deserto por Moisés (21:4-9), e os animais, considerados particularmente abençoados, são liberados nos bosques próximos. Acredita-se que maltratar uma dessas cobras bentas significará estiagem, calor excessivo e más colheitas para a região pelo menos até que chegue a festa do santo no ano seguinte. Parece que este ritual substituiu um muito mais antigo em honra à Angitia, uma deusa serpentina venerada pelos marsi, povo pré-latino da Itália do Central e do Sul, cujo centro religioso se localizava justamente na Província de Áquila, mas as fases deste processo de transformação religiosa estão ainda muito longe de estarem claras aos estudiosos.

Imagem: Devotos carregam a imagem de São Domingos Abade, parcialmente coberta de serpentes vivas, em sua procissão anual pela cidade de Coculo, na Província de Áquila, no sul da Itália, em 6 de maio de 2018.


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