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O Caminho da Dupla Observância

Ele e ela, aqueles que seguem a trilha da Arte Inominada, percebem o mundo com os olhos da Lua e do Sol, porque ao adotar estes dois corpos celestes como um poder duplo de nossa percepção do mundo, é possível nos orientarmos por dentro e por fora.


O olho do Sol percebe a ordem temporal à medida em que desponta todos os dias para renovar o mundo, enquanto a Lua espalha seu reinado através da Noite em presságios e em sonhos. O olho do Sol percebe o padrão do dia, o secular e o comum, o que está ligado à alegria e à atividade, às decepções e a todas as formas de comportamento externo. O olho da Lua percebe o que se move por baixo, como os nervos ópticos do olho da Lua são feitos das redes de micélios, nos subterrâneos que percorrem a Terra e nos vapores que planetas e estrelas transmitem à noite, o que veremos ao Sol nascente sob a forma do orvalho matinal. Esta é a bênção da lua a evaporar sob a vigília do sol.


Essa sempre será a percepção do que outrora foi chamado de “bruxa”, a “sábia”, “aquela que não é daqui”, ou “aquela que percorre a trilha da Lua” no auge do sol.


Essa percepção única, essa clareza de visão, essa observância do que é define o que está oculto no ícone da bruxa; é nisso que a verdade da Arte Inominada repousa, se enrolando e girando, vibrando dentro do grande mistério velado pelas escamas, pela terra e pelas matas. É assim que é possível enxergar o poder inerente a tudo e ver o que está à nossa frente em sua integridade, e não uma projeção de nós mesmos.


O Sol não briga com a Lua; eles simplesmente dão as mãos em uma dança suave, onde o Sol desce ao reino dos ancestrais ​​e a Lua reina o mundo através de seu mistério. Vida e morte, um dependendo do outro, e o único binário verdadeiro que temos é que se não estamos vivos, estamos mortos.


Esse panorama é onde procuramos entender o que há na ausência da discriminação, e é o olhar da bruxa. É aqui que vemos o que é necessário, suas estruturas secretas e seu poder. É com esse olhar que vai além de bem e mal em que morte e vida vivem em igual compreensão e é onde nasce a dupla observância. O Diabo e o Santo são igualmente reverenciados enquanto damos a mão esquerda ao Sol e a mão direita para a Lua em uma adorável e horrível heresia. Nessa visão em múltipla escala que permite ao mais astuto enxergar sob um simples santo as camadas mitológicas para captar o poder do que ele é, porque um santo é um morto-vivo, é uma força que se move e influencia após a morte e questiona se o único binário verdadeiro é tão verdadeiro quanto pensávamos.


O olhar do Sol e da Lua nos dá clareza e mistério ao mesmo tempo, e se nos refrearmos de julgar o que é percebido – uma atividade que sempre é proveniente do nosso medo de transformação e ansiedade relacionada às mudanças – poderemos ver como vê o dragão. Não veremos São Miguel como o exorcista de Deus, mas como aquele que conquistou o domínio da manifestação, como aquele que mantém as forças caóticas do mundo sob sua capa, porque é assim que o Sol tempera a elevação. Não veremos Lúcifer como traidor do plano divino, mas como a felix culpa que restaura a vitalidade da Terra e, como tal, aquele que reina supremo como o Senhor do Mundo. São Miguel, o olho do Sol, São Lúcifer, o olho da Lua, de mãos dadas enquanto abraçam nosso mundo através dos raios do Sol e do pulso úmido da Lua, deixando o orvalho da manhã nas folhas do mundo como um símbolo do seu compacto.


E se você tem olhos para ver, verá …

Créditos da imagem: Pixabay


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