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Um recado de Exu


O discurso de Exu


Sou fogo molhado rubro sangue que aquece e explode e a alma que cresce e que pode fazer o que quer fazer. É fogo do inferno veneno que faz ficar forte e que não se cospe é pra beber com gosto e ousadia. E se souber fazer um dia é pra acender caldeirão de ferro preto com madeira e osso dentro e jogar a luz do inferno na noite da terra e sentir que você é quimera. Quimera de homem e deus.


Cigarro brasa picada de aranha de escorpião de cobra e nem se nota as feridas que brotam o sangue ardente que banha o tridente e a capa da sombra que se pressente ser natureza da essência da alma.


Mais calma.


A hora é grande e o tempo é pequeno e espaço é sempre tão simples descendo e subindo a coisa é mais complicada e pra subir só com risada.


Se joga no chão pra ralar que sangue escarlate faz corar as marcas no corpo que vão escrever teu nome teu santo teu demônio teu eu e no espelho não as verá será preciso fechar os olhos na mata e na tumba e ouça a história da calunga e saiba que a raiz sempre brota de lá.


Moço que arde e brasa de gente é todo o mago que passa nesse presente que ganha o poder de se transformar.


Desce desce com a gente e vem arrancar espinho do chão e vem ver de perto a maçã de Adão que Eva deixou na mesa de jantar. Sobre subir é caso outro e mais complicado e digo que sobe e sobe um bocado aquele que se deixa queimar.


Na capa e no sangue do fogo do inferno acha teu próprio e certeiro estado que vai te fazer ainda mais encantado e te dará as coisas tão primordiais.


Recado de gente que dança na chama é sangue que jorra do beijo da aranha que a teia chamou pra te enrolar.


Saúdo o moço meu companheiro e saravá nesse vespeiro que tu pediu pra chacoalhar.


Um breve comentário


As palavras que vem do invisível nem sempre são claras. Entretanto, procure nas entrelinhas. Esforce-se para perceber as nuances e as brincadeiras e aquelas pistas que estão lá colocadas propositalmente, de maneira que as fichas só caiam nos momentos certos. Faça isso e a recompensa será mais do que satisfatória.


Não podemos jamais duvidar dos recados que nos são dados. Todos são reais. Todos são legítimos. Todos são aspectos da nossa própria natureza. Isso não quer dizer que devamos seguir os conselhos cegamente o que não podemos discordar. Notem bem que verdades existem muitas e em muitas camadas e em algumas elas são lidas como mentiras. A realidade se mistura em tramas que nem sempre nos parecem harmônicas, mas que se misturam assim mesmo. E quem somos nós para dizer o que pode o que não pode, afinal?


Por isso, as palavras dos espíritos nem sempre são precisas. Como poderiam? Elas vem do reflexo do nosso mundo e se embaralham em caminhos tortuosos para chegarem até nós. É importante perceber que parte da confusão na equação vem de nós mesmos. Somos o filtro dessas coisas e deixamos nelas nossos resíduos. Perceber isso é entender parte do código.


Isso encerra em si um mistério: nós somos partes do mundo espiritual também. E como poderia ser diferente?


Por isso, não existe, meus caros, ninguém que não viva sua espiritualidade. Isso é uma besteira. O que existem são várias maneiras de se vivenciar isso. Algumas mais conscientes do que as outras, talvez.


Eu diria que a natureza do homem é sua sina – e que isso passa necessariamente pela presença do espírito.


Divago, entretanto. E eis aqui um dos efeitos mais maravilhosos que as palavras do Exu poderiam ter despertado em mim: a reflexão.


A reflexão que eu divido com vocês com alegria e na esperança de que procurem também ouvir a voz do invisível.


*Imagem retirada de https://religiao.culturamix.com/religioes/quimbanda/

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