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Foto do escritorNicholaj Frisvold

Os Encantamentos de Circe – II Encantamentos Astrológicos

Giordano Bruno fala sobre vínculos em sua tese sobre Magia Matemática, ou seja, sobre as formas em que um espírito é ligado ou liberado entre si e aquele que o convoca. Ele explica que alguns destes laços são obtidos do mundo natural e outros do mundo celestial, e aqui Bruno reúne invocações, exorcismos, ervas, flores, gelo, neve, elementos do mundo natural que são igualmente importantes quanto os do mundo celestial. Os vínculos celestes se relacionam aos raios, céus, estrelas, orbes, fortunas, sortes e outros assuntos que invocam um período astrológico correto (ou uma eleição astrológica). Mais adiante, ele afirma que os laços mais fortes e altos são aqueles que provêm do mundo intelectual e divino, um laço que é gerado ao ‘suplicar ou abençoar’. Este laço há de ser uma comemoração das coisas celestes que surgem a partir dos mistérios. Ele até dá um exemplo que podemos encontrar em Gênesis 3: 13 – 15, Números 21: 6 – 9 e Lucas 10:19, sobre o uso da serpente. Nesta sequência, encontramos a expulsão das serpentes do Éden, Moisés erguendo uma cruz de serpentes para afastar as serpentes e, finalmente, em Lucas, sobre como os seguidores de Jesus receberam o fio de poder sobre as serpentes.


Esse motivo é interessante, pois encontramos o uso de cobras como um vínculo relacionado ao comando e domínio até mesmo na Noruega, assim como foi registrado por Mary Rustad em sua tradução de um manual norueguês de magia popular chamado The Black Books of Elverum:


“Bata em uma cobra com um graveto até ela morra e levante a saia de uma mulher com o mesmo graveto três vezes para fazê-la conceber”


O ponto é como um vínculo é estabelecido, porque o vínculo e seu uso sempre se relacionavam com uma compreensão do próprio vínculo e de como ele poderia ser usado para o bem e para o mal. Nesse feitiço, é claramente a forma fálica da cobra que é confrontada com outro objeto fálico, e que pretende gerar um atrito relacionado à vulva e à concepção.


Vejamos as diferenças entre Circe e suas conjurações à luz do que encontramos em um clássico da magia cerimonial, o Heptameron de Pedro de Abano, que convoca o Sol da seguinte maneira:

Eu vos conjuro e vos declaro, anjos fortes e santos,

Em nome Adonai, Adonai, Eye, Eye, Eyu, aquele que era e será, Eye, Aloraye, em nome Sadaye, Saday, Cados, Cados, Cados, alto, sentado acima dos querubins, e por Seu nome, grande, santo, forte, poderoso e exaltado, acima de todos os céus, Eye, Saraye, Criador das eras, que criou o mundo, o céu, e a terra, o mar e todos aqueles que neles estavam no primeiro dia dos céus, e selou sobre eles com Seu santo nome, Yhon, sobre a terra, pelos selos da terra, por seu honrado e precioso nome Yhaa, e pelos nomes dos santos anjos que governam na primeira hoste e servem na presença do anjo mais poderoso, grande e honrado Salamia, e pelo nome da estrela que é o Sol, e pelo sinal mais imensurável do Deus vivo por quem tudo é predito, eu conjuro o anjo Rafael, que é o comandante do dia do Senhor, e pelo nome de Adonai, o Deus de Israel, que criou o mundo e tudo o que nele existe, que trabalhes para mim e cumpra todos os meus desejos que são meus pedidos, votos e súplicas em minha aflição.


Temos que levar em conta a influência tomista aqui, desde que Tomás de Aquino havia declarado claramente em sua Summa que a magia poderia ser lícita, e se a pessoa estivesse presente com devoção no momento oportuno, uma certa virtude estaria presente, ou seja, ao amanhecer você poderia recitar a oração de Pedro de Abano e deixando os itens mágicos para fora, para fossem empoderados pelo Sol, mas sem nenhum impulso ativo para fazer alguma coisa acontecer. Tirar proveito de um raio divino natural de modo passivo era considerado pelas leis da Igreja como em harmonia com a ordem divina. Agora, se olharmos para a conjuração do Sol por Circe, vemos uma mudança bem clara.

“Oh Deuses, eu os conjuro novamente – por que hesitam? Por que cumprem os desígnios destes criadores de formas, falsificadores dos sinais da natureza? Júpiter verdadeiro, cuja majestade ultrajada se revela através de vós, e também exerce poder sobre vós. O pai da humanidade vos obriga, no poder de quem eu vos vinculo três e quatro vezes. Também exerço poder sobre vós através dos outros que têm o poder de governar os deuses, acima de todos os outros tipos de criaturas vivas; para que não me atrapalhes com seus sofismas mortos, para que a verdade se manifeste em aparências exteriores que se manifestam visivelmente … Eu, portanto, os atormentarei ainda mais com uma terceira conjuração … ”


Circe não está suplicando como uma humilde devota dos espíritos planetários, ela exige e não apenas isso, ela também dá um chute nos praticantes clericais, ‘os falsificadores’, e assim chama a atenção de Saturno sob o panegírico “falxifer”, enquanto salta à Júpiter e o lembra de sua essência e virtude, mas também o lembra de seu lugar…


Circe está simplesmente demonstrando que ela não apenas conhece a si mesma, mas também conhece a virtude mais profunda de cada um e conhece seus lados bons, os lados ruins e até como eles podem ser hipocritamente propensos ao elogio, portanto ela exige… Ela exige porque ela sabe que é filha de Sol, ela é seu próprio eixo e cosmos, ela é seu próprio fogo e centro e é a partir disso que ela comanda os planetas e estabelece laços para efetuar o que ela quer que seja feito.


Ela demonstra em sua atitude o que é uma “bruxa”, alguém que não se ajoelha por ninguém, mas presta reverência à quem a reverência é devida.


Ela é consciente sobre sua linhagem, ela é a filha do Sol, a estrela polar visível do nosso mundo, o prego estelar que dita a premissa para o mundo e propicia a vida noturna, onde ela encontra consolo e espaço para encontrar seu centro todos os dias. Circe não hesita, como os deuses fazem, Circe é “o outro lado”, o caminho tortuoso e mesmo assim direto que leva o touro pelo chifre e o diabo pelo pau. Ela encarna o ofício e Giordano Bruno era foi seu mensageiro.


Imagem: Circe por Giovanni Benedetto Castiglione

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