A posse de conhecimento considerado proibido era atribuída aos sábios (cunning folk) desde o início dos tempos. Estas pessoas eram consideradas de alguma forma diferentes, às vezes vistas com respeito, outras vezes com temor. Esse conhecimento tomaria forma na capacidade de realizar atos de magia, encantamentos, curas e com muita frequência, adivinhações, fossem elas através de uma declarada clarividência ou através do uso de oráculos, visões ou sonhos. Outras vezes, estas predições eram baseadas em uma observação aguçada de padrões naturais e comportamentais.
A adivinhação era um assunto complicado para a igreja, porque aqui a adivinhação entrou para um território proibido, um reino em que alguém estaria invadindo o mundo de Deus. Tomás de Aquino escreveu sobre isso em sua Summa:
“Adivinhação é um esforço para se conhecer o futuro pelo uso de meios supersticiosos. Atribui às criaturas o poder de conhecer ou divulgar absolutamente o futuro, enquanto esse poder pertence somente a Deus. Portanto, a adivinhação é sempre um pecado.”
E ele elaborou sobre este tema, afirmando que a adivinhação frequentemente recorria ao auxílio de demônios para o conhecimento do futuro e, assim, a adivinhação podia evitar a má sorte e atrair a boa sorte. Isso pode parecer excelente hoje, mas para a igreja medieval essa era uma negação do fado divino, e a manipulação da sorte de uma pessoa fosse uma grande heresia e um pecado grave.
Para Tomás, a adivinhação se relacionava à invocação direta de demônios, à leitura de augúrios, a necromancia e a interpretação de presságios, visões, sonhos, etc., que visassem informar algo sobre o futuro, pois ele considerava a tudo isso um forte indício de pacto implícito com algum diabo.
Esses argumentos são interessantes de muitas formas, pois ele aqui toca algo surpreendentemente central na arte inominável: como o sábio, através da intervenção e pacto diabólico se torna um criador de destinos, porque de fato, esta é a natureza dele.
Sobre a questão do destino, pode ser que essa relutância em sua manipulação tenha surgido ao fornecimento do conteúdo religioso à ideia estoica de Amor Fati, ou o Amor ao Destino. Para os estoicos, era crucial abordar com amor a qualquer obstáculo colocado em seu caminho. O obstáculo fazia parte do caminho e, por extensão, do Destino. Se você se esforçasse em direção à bondade, isso por si só seria suficiente para que você parasse de brigar com o destino, pois isso faria de você uma pessoa cada vez melhor. Os estoicos, no entanto, mantinham não só Eros (Amor) em alta estima, mas ainda mais Veritas (Verdade) e Fortuna (Destino/Sorte). A ideia por trás disso era que, ao se esforçar para ser uma boa pessoa, você acabaria atraindo a benevolência de Dama Fortuna.
Para o sábio, no entanto, o reino do Destino seria algo um pouco diferente, pois tratava-se parcialmente de entender situações com base no entendimento dos passos que foram tomados para que uma situação se manifestasse. Era esse impulso em direção ao conhecimento e à compreensão nascida de uma profunda intuição e este pré-conhecimento levaria o sábio a tomar a roda da Fortuna e movê-la alguns graus para cima ou para baixo, para seu próprio benefício.
E aqui estamos realmente nos movendo para a teoria proibida, e é por isso que esse tipo de conhecimento de que seja possível manipular a ordem natural das coisas era considerado proibido, e que assim, deveria ser “oculto” dos seres humanos. Esse conhecimento proibido tem muitas camadas, mas a primeira dessas camadas começa com o Sol e a Lua e a percepção de que as leis dadas pelo mundo sob o Sol são diferentes das leis noturnas, sob o governo da Lua. O Sol e a Lua são representados por nossos olhos, olho esquerdo para a Lua e olho direito para o Sol, visando, portanto, um equilíbrio perfeito de entendimento. Nesse acesso de equilíbrio a manipulação é possível. Se conseguimos ver o curso do Sol com os olhos da Lua, atravessamos para o outro lado para enxergar o que está oculto sob o Sol e que geralmente é revelado apenas pelos olhos da Lua. Este é o segredo do “terceiro olho”.
É neste reino que a clarividência se torna possível, e é aqui que a faculdade da adivinhação ou visão clara (clara vidência) se torna evidenciada. Começamos a entrar em contato com um determinado dom, geralmente atribuído a anjos caídos ou dragões, através do significado do drakon grego, que significa ‘ver claramente’. O cultivo deste dom é essencial ao crescimento do sábio, porque aqui ele ou ela entrará em contato com algo muito essencial da Arte Antiga, uma percepção única que permite ver claramente quem são as pessoas, o caminho que o Destino está preparando e como a trilha se desenrola antes que ela forme suas curvas.
É por esta razão que numa parte dos ritos de iniciação à Palavra dos Cavaleiros, o candidato deve receber o dom do Diabo por pacto, de que ele chegaria a esse ponto através dos “ganchos e garranchos do caminho”, porque depois que esse pacto é concretizado a semente da clareza é plantada e o dom do criador do destino começa a evoluir para aquele ser que era respeitado ou temido desde o início dos tempos, o sábio amoral que sabia demais e, em virtude desse poder, dava consolo e solução aos mundos de ambos os lados do véu.
Imagen: The Persian sibyl por Crispin van de Passe II (c. 1597-1670)
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